Jon Jones anunciou que vai parar. De novo.
Mas o anúncio, como tantos outros no mundo da luta, veio cercado por silêncio, dúvidas e um peso que vai além do corpo cansado:
o que acontece quando o lutador sai do cage — mas a luta continua dentro dele?
Parar é inevitável. O que vai acontecer depois disso, não.
Ao contrário de outros desportos com sindicatos e estrutura de transição, os desportos de combate seguem sem rede.
A maioria dos atletas para sem aviso, sem preparação e sem garantias.
Para muitos, a carreira termina por lesão, idade ou ausência de contrato — não por decisão.
Segundo matéria do Bleacher Report, cerca de 80% dos lutadores que anunciam que vão parar acabam por voltar aos ringues ou cages. Nem sempre por paixão.
Quase sempre por necessidade.
Eles voltam mais velhos, mais lentos, com mais riscos e menos a provar. Voltam porque a conta chegou. Porque o corpo está exausto, mas a cabeça ainda escuta os aplausos.
“Você acorda e percebe que não é mais ninguém.”
— Jens Pulver, ex-campeão do UFC
Durante anos, o atleta é chamado de “campeão”, “guerreiro”, “ídolo”.
Depois… o silêncio.
A ausência da rotina de treino, da comunidade e da adrenalina provoca um vazio real.
Psicólogos do desporto chamam isso de colapso identitário atlético.
Estudos apontam que essa fase mal resolvida pode levar a quadros de depressão, ansiedade e perda de propósito.
E isso não acontece só com quem ganha milhões. A maioria dos lutadores para sem título, sem mídia e sem plano.
A Cleveland Clinic analisou ex-boxeadores e lutadores de MMA e encontrou níveis elevados da proteína NfL — um marcador de lesão cerebral — mesmo dois anos após o fim das lutas.
O dano é cumulativo. E silencioso.
Muitos desenvolvem demência precoce, dificuldades motoras, alterações de humor e falhas de memória.
Casos como o de Gary Goodridge, diagnosticado com demência pugilística, acenderam o alerta:
as consequências continuam mesmo depois de pendurar as luvas.
O retorno mal planejado é recorrente.
Evander Holyfield, BJ Penn, Leonard Garcia — todos voltaram e pagaram caro: fisicamente e na reputação.
A falta de visibilidade e suporte fora do cage torna o “voltar” mais viável do que construir algo novo.
“Estou apavorado com o que vem depois.”
— Anthony Smith, UFC
Não há programa oficial para ajudar atletas a fazerem essa transição.
O que existe é um ciclo: parar, tentar outra coisa, não encontrar propósito… e voltar.
Há exceções. Mas nenhuma por acaso.
Daniel Cormier, Dominick Cruz e Michelle Waterson são exemplos de atletas que usaram os anos finais de carreira para construir o que viria depois.
→ Tornaram-se analistas, treinadores, empresários.
→ Investiram em educação, rede de contatos e marca pessoal.
Estudos em psicologia desportiva mostram que atletas que desenvolvem múltiplos papéis sociais ainda durante a carreira têm uma transição mais saudável.
Ser só lutador não basta — é preciso ser mais do que a própria função.
O fim da carreira num desporto de combate não precisa ser um nocaute.
Pode ser um novo round.
Mas para isso, é preciso preparação, suporte e, acima de tudo, uma mudança de mentalidade — do “lutar até o fim” para o “saber sair em paz”.
Parar faz parte da luta. Perder-se depois dela, não precisa ser.
Este artigo é uma produção original da Social Digital Fight para a Fight News.
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